Esta é a Carta 7 de uma série de correspondências entre escritores que chamamos carinhosamente de Trocando Farpas: Nós da Impérios Sagrados escrevemos a Carta 1 e Carta 7. Fabio Pires escreveu a carta 2 e a 8. O Inominável Ser escreveu a carta 3 e a 9. O Samir Cooper escreveu a carta 4 e escreverá a 10. O Ruan Giollo Brugnerotto escreveu a carta 5 e escreverá a 11. Leonardo E Dutra escreveu a carta 6 e também escreverá a 12.
Qual a periodicidade dos posts das cartas? A cada 4 dias!
A pergunta que não quer calar é: Pode a literatura falar de política sem se sujar?
Os links serão adicionados à medida que as cartas forem publicadas:
Sim, Já posso adiantar que é possível que a literatura fale de política sem se sujar, por exemplo, parando de comprar e ler os livros de Olavo de Carvalho (sic!). E qual o motivo? Vamos lá…
Hans Robert Jauss formula algumas teses sobre a relação entre leitor e obra e que ele denomina como teoria do efeito estético. Em sua “7ª tese observa os aspectos diacrônico e sincrônico e abarca a experiência cotidiana do leitor, rompendo com seu horizonte de expectativas, possibilitando uma visão crítica quanto à leitura da obra em questão e quanto à leitura de obras posteriores. Considera, além do efeito estético da obra, também seu efeito social, ético e psicológico.”
A íntima relação entre literatura e vida, explicitada na sétima tese de Jauss (1994), pressupõe uma função social para a carte de criação literária, pois, devido ao seu caráter emancipador, abre novos caminhos para o leitor no âmbito da experiência estética. Quem lê é capaz, por meio da literatura, de visualizar aspectos do seu cotidiano de modo diferenciado. E isso é justamente o que provoca a experiência estética, pois “a função social somente se manifesta na plenitude de suas possibilidades quando a experiência literária do leitor adentra o horizonte de expectativas de sua vida prática”.
Ou seja: quanto mais lemos e quanto mais lermos coisas diferentes que possam apresentar diversas opiniões sobre o mesmo assunto, mais ampliamos o nosso poder de reflexão. Mas é aí que mora o perigo: o quê estamos lendo?
Considerando o papel da memória no processo de leitura, podemos perceber como ela depende do que somos, de nossa formação, dos nossos conhecimentos anteriores com os quais se estabelece desde o primeiro impulso um leitor uma interessado: obter informações (conhecimento); conseguir o autoconhecimento; interpretar mais adequadamente o mundo que nos rodeia e com ele interagir e obter prazer são alguns dos processos que acontecem quando lemos.
Mas se lemos autores cuja visão de mundo é baseada, por exemplo, no racismo e no machismo, estamos consumindo algo que irá se alojar e entranhar em nossa mente como uma erva daninha.
Na medida em que a literatura propicia rupturas o questionamento das normais vigentes, delineia-se seu aspecto social e formador. Quando, ao contrário, promove a perpetuação dos padrões de conduta da sociedade vigente, o canônico ou o normativo, no entender de Jauss (1994), torna-se uma “literatura de culinária”, de caráter reprodutor e pouca ou nenhuma qualidade reflexiva. A contribuição da literatura na vida social se dá justamente quando, por meio da representação, ela promove a queda de tabus da moral dominante e oferece ao leitor possíveis soluções para os problemas de sua vida.
Ler diversos pontos de vista sobre o mesmo assunto é importante, porém, se da mesma forma que com as fake news não formos atrás de saber quem é que escreveu e suas motivações, corremos o risco de assumir como verdade aquela opinião. E acabar por reproduzir em nosso comportamento uma visão de mundo cheia de preconceitos.
A experiência estética, assim como entende Jauss , torna-se emancipadora na medida em que abarca três atividades primordiais que relacionam-se entre si: a poesis, a aisthesis e a katharsis. A poesis compreende o prazer do leitor ao sentir-se co-autor da obra literária; a aisthesis, o prazer estético advindo de uma nova percepção da realidade, proporcionada pelo conhecimento adquirido por meio da criação literária e a katharsis, o prazer proveniente da recepção e que ocasiona, tanto a liberação, quanto a transformação das convicções do leitor, mobilizando-o para novas maneiras de pensar e agir sobre o mundo.
E como seres políticos que somos, temos sim nossa responsabilidade social: o que iremos deixar no mundo após nossa partida final? O que de minhas palavras permanecerá? E como ela afetará quem aqui permanecer?
Por isso, recorro à autora Hannah Arendt nas linhais finais da nossa primeira carta Trocando Farpas. Hannah Arendt é considerada uma das maiores personalidades do século XX. Ela foi uma cientista política alemã de origem judaica, uma grande filósofa (termo discutido pela própria autora). Para a autora, a política está intimamente ligada à liberdade e se dá na construção de um mundo para convivermos. Partindo desse pressuposto, baseado no pensamento de Hannah Arendt, de que a política não é domínio, de que não se baseia na distinção entre governantes e governados e nem é mera violência, mas ação em comum acordo, ação em conjunto, sendo reflexo da condição plural da nossa vida em conjunto somos levados a perguntar se o não questionamento de juízos naturalizados pode ser considerado algo perigoso para a nossa convivência no cotidiano?
Afinal, se dentro de nós estiver arraigado toda uma vida cheia de preconceitos, o que iremos reproduzir no mundo que partilhamos em comum com outros seres humanos? Se o que eu leio ou o que escrevo estiver imerso em algo sujo, nojento e nefasto como a homofobia, racismo e o machismo o quanto disso que eu consumo retorna para a minha vida?
Liberdade, há muito, não é fazer o que quiser. Será que podemos escrever o que quisermos sem responsabilidade alguma? Entende-se porque Hannah Arendt considera a liberdade e a ação política como sinônimas, haja vista que não é enclausurando-se em si mesmo, utilizando-se unicamente da capacidade de pensar ou de querer, que um indivíduo passa a ser livre, a liberdade existe onde a condição plural das pessoas não seja desconsiderada. O indivíduo só é livre enquanto está agindo, nem antes, nem depois. E o discurso é uma forma de ação.
Para a autora, “a ação e o discurso conferiram à política uma dignidade que ainda hoje não desapareceu completamente.” A ação se revela por meio das palavras, daquilo que se fez, se faz ou se pretende fazer. Nesse sentido, a política é a única forma possível para o processo de autoconhecimento, para o gerenciamento da vida humana em conjunto, e para o convívio e o debate público. A política fornece um sentido para a vida humana na Terra, mas ela não se esgota, ao contrário disso, ela embasa a existência humana, quando se a quer livre. O discurso e a ação são os meios pelos quais os homens se distinguem enquanto seres humanos, o que apenas ocorre no espaço público e político.
A literatura pode e deve falar e fazer política sim. Quando consideramos o mundo como um lugar comum para se viver e não um apanhado de nossos preconceitos e opiniões que podem ferir, machucar e até mesmo matar outrem.
E você, querida e querido colega de escrita, o que pensa sobre isso? Podemos escrever o que quisermos sem nenhuma responsabilidade política? rsrs sim, aqui já tem uma crítica embutida rsrs
A literatura é política! Viver nesse grande condomínio, que chamamos de sociedade, é estar mergulhado em uma arena política. O grande mal entendido que vemos atualmente, nem seu se é tão atualmente assim, é que muito se confunde política com politicagem, o que faz a grande parte das pessoas até evitar certos posicionamentos. E nesse adestramento, nessa prisão mental, encarceram o exercício mais pleno e genuíno de liberdade.
Parabéns pela iniciativa! E que venham mais cartas e farpas!
Escrever sem qualquer tipo de responsabilidade para com o conteúdo se torna sempre algo muito péssimo em diversos sentidos. Tomo como exemplo as histórias de Terror, Horror e Guerra que eu escrevo, onde diversas vezes menciono estupros, torturas, atos pedófilos e tudo que é crime hediondo. Eu menciono sem, no entanto, detalhar ao extremo tais atos ou fazer dos mesmos algo a ser defendido como bom e aceitável. São os meus Personagens praticando tais atos, não eu, O Escritor, que os pratico na vida real ou incentivo criminosos a praticarem. Consigo me separar do que escrevo, tendo a responsabilidade de, deixando livre meus Personagens, não os direcionar até a minha própria personalidade. Eu não sou nenhum(a) deles(as) e nenhum(a) deles(as) é o que eu sou. Não faço ideologicamente propaganda de atos criminosos dos meus filhos e filhas (é assim que chamo os meus Personagens) dentro e fora da Internet, nem do que eles pensam dentro dos Universos Mitológicos nos quais estão inseridos. Meus ideais políticos são bem particulares, bem afastados da maioria dos escritos mais viscerais que tenho.
Comentei sobre mim, crendo que serei compreendido aqui, acima. Agora, falando de quem não se desvencilha do que escreve, não tem a mínima preocupação em ser responsável ou pensa diferente do que expõe no papel, já se configura uma história bem diferente. São pessoas que não tem um controle de si mesmas, consideram que suas visões ideológicas, nos pensamentos, atos e palavras de seus Personagens, são Leis que podem ser válidas para o mundo inteiro. É o caso do Olavo de Carvalho citado no texto e o da atual J. K. Rowling, dois grandes exemplos de escritas que espelham exatamente como seus desenvolvedores são. Outro caso que menciono é o de Varg Vikernes, da lendária Primeira Formação da banda de Black Metal Mayhem, que matou Euronymous, o qual era um dos três membros fundadores da mesma. Hoje, ele é um Neonazista declarado que publica livros e artigos expandindo seu pensamento Racista e Racialista pela Internet e impressos para quem pensa como ele. Politicamente, esses três exemplos são criminosos, irresponsáveis e reflexos do Ódio e dos Preconceitos que foram acelerados, postos em erupção, com o advento da Vida Virtual como hoje está sendo desenvolvida. Muitos outros Autores e Autoras são como eles, defendendo sempre os Crimes que cometem como "Liberdade de Expressão". Nenhum deles interpreta um Personagem, eles expressam por escrito o que carregam dentro de si de ideologicamente deturpado, agressivo e discriminatório.
Há quem seja como eu no Mundo Literário e quem seja como eles também, lógico. No entanto, pessoas leigas confundem sempre as coisas e o tipo de Literatura que eu desenvolvo, assim como a de Autores e Autoras que escrevem também visceralmente, possa vir a gerar diversas interpretações errôneas. Ideologicamente, então, todo mundo é posto no mesmo barco e aqui está um IMENSO problema.
Nós também acreditamos que sim! É preciso olhar para a responsabilidade social do que escrevemos. Mas essa é a nossa opinião... Vamos ver o que o @fabiopires que postará a segunda carta hoje, vai dizer! Obrigado por nos acompanhar, Tiago!
Política intimamente ligada à liberdade. É isso.
Devemos falar de política sim
A literatura é política! Viver nesse grande condomínio, que chamamos de sociedade, é estar mergulhado em uma arena política. O grande mal entendido que vemos atualmente, nem seu se é tão atualmente assim, é que muito se confunde política com politicagem, o que faz a grande parte das pessoas até evitar certos posicionamentos. E nesse adestramento, nessa prisão mental, encarceram o exercício mais pleno e genuíno de liberdade.
Parabéns pela iniciativa! E que venham mais cartas e farpas!
Escrever sem qualquer tipo de responsabilidade para com o conteúdo se torna sempre algo muito péssimo em diversos sentidos. Tomo como exemplo as histórias de Terror, Horror e Guerra que eu escrevo, onde diversas vezes menciono estupros, torturas, atos pedófilos e tudo que é crime hediondo. Eu menciono sem, no entanto, detalhar ao extremo tais atos ou fazer dos mesmos algo a ser defendido como bom e aceitável. São os meus Personagens praticando tais atos, não eu, O Escritor, que os pratico na vida real ou incentivo criminosos a praticarem. Consigo me separar do que escrevo, tendo a responsabilidade de, deixando livre meus Personagens, não os direcionar até a minha própria personalidade. Eu não sou nenhum(a) deles(as) e nenhum(a) deles(as) é o que eu sou. Não faço ideologicamente propaganda de atos criminosos dos meus filhos e filhas (é assim que chamo os meus Personagens) dentro e fora da Internet, nem do que eles pensam dentro dos Universos Mitológicos nos quais estão inseridos. Meus ideais políticos são bem particulares, bem afastados da maioria dos escritos mais viscerais que tenho.
Comentei sobre mim, crendo que serei compreendido aqui, acima. Agora, falando de quem não se desvencilha do que escreve, não tem a mínima preocupação em ser responsável ou pensa diferente do que expõe no papel, já se configura uma história bem diferente. São pessoas que não tem um controle de si mesmas, consideram que suas visões ideológicas, nos pensamentos, atos e palavras de seus Personagens, são Leis que podem ser válidas para o mundo inteiro. É o caso do Olavo de Carvalho citado no texto e o da atual J. K. Rowling, dois grandes exemplos de escritas que espelham exatamente como seus desenvolvedores são. Outro caso que menciono é o de Varg Vikernes, da lendária Primeira Formação da banda de Black Metal Mayhem, que matou Euronymous, o qual era um dos três membros fundadores da mesma. Hoje, ele é um Neonazista declarado que publica livros e artigos expandindo seu pensamento Racista e Racialista pela Internet e impressos para quem pensa como ele. Politicamente, esses três exemplos são criminosos, irresponsáveis e reflexos do Ódio e dos Preconceitos que foram acelerados, postos em erupção, com o advento da Vida Virtual como hoje está sendo desenvolvida. Muitos outros Autores e Autoras são como eles, defendendo sempre os Crimes que cometem como "Liberdade de Expressão". Nenhum deles interpreta um Personagem, eles expressam por escrito o que carregam dentro de si de ideologicamente deturpado, agressivo e discriminatório.
Há quem seja como eu no Mundo Literário e quem seja como eles também, lógico. No entanto, pessoas leigas confundem sempre as coisas e o tipo de Literatura que eu desenvolvo, assim como a de Autores e Autoras que escrevem também visceralmente, possa vir a gerar diversas interpretações errôneas. Ideologicamente, então, todo mundo é posto no mesmo barco e aqui está um IMENSO problema.
Pode. George Orwell é a prova.
Nós também acreditamos que sim! É preciso olhar para a responsabilidade social do que escrevemos. Mas essa é a nossa opinião... Vamos ver o que o @fabiopires que postará a segunda carta hoje, vai dizer! Obrigado por nos acompanhar, Tiago!