A Conversa Infinita, de Blanchot, e a Alegria Diante da Morte — um diálogo.
Debruçado em seus ídolos mortos, o Animador, contente e resquício, contempla seu próprio diálogo com o defunto — que não está presente na sala. Suas inspirações partem de textos escritos há mais de 100 anos. O que causa tormento no Animador é, em suma, sua vontade de comunicação inatingida. O silêncio ausente de respostas e o vislumbre imaginativo. Seu diálogo é, no fim das contas, com o corpo ausente — a conversa infinita, segundo Blanchot. Há um diálogo entre tudo isso: entre linhas e ‘não’. O mistério é o charme da alegria na ausência — muito além da ‘amizade’ ou ‘comunidade’ que Blanchot se refere. Vai além. Um diálogo entre o cadáver que ainda é revivido e acordado de seu sono perverso. O Animador, sendo vivo, refere ao sonho. São ambos distintos. No sonho, há a morte do homem vivo, sem mais desfiladeiros a ser passado por reta. A alegria, no sonho, é o estado de morte, da ausência e do descanso — ou descaso do corpo com o resto. Resto da sala, do quarto, do vão, da rua, do absurdo cotidiano — este, tão faminto de necessidade e causa que, em merafeito, não se contenta o suficiente em ser passivo, ambulante, amputado. Quer ser mera e puramente ‘chão pisante’. Aquele Animador, passivo de suas falas e que, ao pronunciar N palavra, revive, de forma trágica, Deus. Dimensão de linguagem que ainda não matamos. Só mataremos Deus quando, por meio da morte, excluir a linguagem — homem.
Do outro lado da sala existe, lógico, outro corpo, no espelho. Simulacro contínuo que não possui os pensamentos do refletido. O refletido este, Animador, causa cousas próprias, pensantes, chora e berra. Ainda faz de si, catapulta para o esquecimento da amizade. Quem dera eu ser o corpo ausente que tanto leio, refiro e desperto — pensa o Animador. Se olha no espelho como se soubesse da falta de si. E sabe. Não há outro plano, constância, referimento, senão a morte. A morte de si — pelo sonho, pelo enforcamento, ou melhor, pela morte da linguagem. Aí a alegria que o ausente possui e que, dada-forma, o outro quer. Senta no chão, cruza os braços e permanece sem emitir som. É a ‘refireficácia-non’ do seu sentido único, de morte, íntimo e de alcance. Lance. E tá dito a fala: lance seu corpo contra o espelho. Se aproxime daquela alegria que é não estar.